criticar (um texto)
Oiê, como cê tá?
Tenho pensado bastante na função da crítica. Aprender a lidar com isso é uma parte importante da minha formação em escrita criativa e criação literária. Já me disseram sua história não importa, você não é interessante. Aprendi que isso não ajuda. Que se critica um texto, não o autor. E que, quando a crítica não chega redonda, é possível separar o que serve pra mim, o que deixo na conta do outro que não deu conta de si mesmo. Quando consigo separar, é ótimo. Mas há palavras que me acordam à noite, gritam comigo naquele escuro todo, e me fazem esquecer o que aprendi.
Essa semana um professor comentou meu trabalho do ciclo III da formação em psicanálise. Eu arriscava uma leitura outra de Afetos ferozes, um dos cinco livros que li na companhia de muitas mulheres, e que rendeu quatro horas de conversas, e que segue me intrigando. Em dois, três parágrafos, professor comentou meu pensamento difícil, mas o texto fácil de refletir. Diz que ficou sem entender o que eu falo sobre as mulheres. Não sei se entendi, mas achei bonito. E eu achei bonito também. Como as palavras que eu passei quatro semanas escolhendo o arrastaram a uma certa atmosfera. Como a voz dele emulou a minha.
Foi Stephen King, um texto dele que chegou aqui pela primeira vez em 2019, trazido pela minha guardiã Gabriela Aguerre, quem disse que escrever é telepatia. Ele escreveu esse texto em uma manhã nevada de 1997, eu o leio de novo em julho de 2021. Eu jamais abri minha boca, e você jamais abriu a sua. Nós não estamos nem no mesmo ano, quanto mais na mesma sala... mas estamos juntos. Estamos próximos. Estamos tendo um encontro de mentes.
Antes de estudar a escrita, eu não escrevia. Tinha medo da crítica. Sua história não importa, você não é interessante. Escrevendo descobri que o meu crítico mais severo não está só por perto, ele habita meu corpo. Hoje eu tento não escrever mais pra ele. Escrevo para me deslocar. Eu comigo, eu para fora de mim. E, quando compartilho minhas palavras, é por conta dessa fé besta de que talvez estejamos juntas. Próximas. Quem sabe tendo um encontro de mentes. Mas, claro, nem sempre calha de acontecer. Ouvi esses dias, de dona Maria, uma mulher muito simples, que nem Jesus Cristo agradou todo mundo, e espero nunca me esquecer disso.
Me parece que algo aqui conversa com o que li essa madrugada num texto de Alice Walker, escrevendo sobre a colega nigeriana Buchi Emecheta, quando diz que prefere escrever para os seu cinco filhos, que um dia se tornarão adultos, do que adequar seu texto para certos críticos maduros que se transformam em crianças de vez em quando.
Eu queria falar sobre a crítica, como fazer uma crítica, mas releio minhas palavras, não sei mais se coloquei tudo a perder nesse texto difícil. Oi, meu super censor. Me lembro aqui de Augusto de Campos em O anticrítico, um livro de 1986 que me foi apresentado também em 2019 por outra mulher incrível, Marília Garcia. Nada contra a crítica iluminadora, ele disse. O que abomino são os críticos que praticam aquilo que já chamei de “dialética da maledicência”. Os que não iluminam, nem se deixam iluminar.
Foco na luz. Como criticar. Carolina Zuppo Abed, que dá oficinas de escrita pelo mundo afora, e ainda hoje me faz pensar sobre os processos de ensino-aprendizagem do ofício, me contou também em 2019 que o cérebro fica atrás dos olhos. O que, em outras palavras, significa que você está falando com uma pessoa inteira, não com o cérebro dela. Pessoas têm olhos, ouvidos, sentimentos. Aponte o que é bom. Conecte-se com o que a pessoa quer fazer. Ela deu conta? Mostre onde o texto se aproxima de seu objetivo, onde se afasta. Gosto é subjetivo. Quais são os critérios objetivos que te guiam na leitura?
Meu super censor tem vontade de dizer, pra encerrar esse texto, que eu escrevo isso tudo talvez porque meu livro tenha voado essa semana para sete lugares diferentes, incluindo Goiás, Santa Catarina e o Espírito Santo, e eu estou curiosa pra saber se e como nos encontramos, que palavras você tem para mim. Me conta?
Te deixo um beijo.