tudo começa com um coração partido
Meu primeiro fora literário chegou hoje. Veio por escrito. Thank you for your submission, blablabla, thanks again, blablabla, best of luck. Acho que foi a primeira vez que tomei um fora assim, por escrito. Não tem um motivo claro. Poderia, né? Já que por escrito. Sei que essa recusa não me define, nem quero que, mas ao mesmo tempo fico lendo as palavras todas, although we must decline, blablabla. É estranho. Não cai tão bem quanto eu gostaria. Mais como aquela bigorna que despenca do nada bem em cima do personagem de desenho animado. Crushing it.
Crush é uma palavra que no Brasil a gente usa pra falar de quem a gente gosta. Ter um crush em alguém. Ou: fulano é meu crush. Mas crush também é verbo, /krəSH/, e descreve o que a bigorna faz quando cai em cima do personagem de desenho animado. Comprimir ou apertar com força, com o intuito de quebrar, danificar ou destruir a forma. Sinônimos de /krəSH/ são amassar, moer, desmoronar, lascar, triturar, desintegrar. Although we must decline, e olha eu aqui de novo. Fico pensando nas coisas que tenho lido sobre o que nos constitui. É do desejo de alguém que nos constituímos sujeitos. Foi ali, quando alguém acreditou que éramos tudo, tudo, tudo, que começou a nossa história. E a gente, depois de ter se sentado no trono, descobrirmos junto daqueles que nos acreditaram, e não necessariamente no mesmo tempo, que não somos tudo uns para os outros. Que há, sim, muitos outros desejos.
Não ser tudo na vida, que lição difícil de aprender. A cada fora que levo, parece que a dor do primeiro fora entra em cena, mas sem os detalhes que me façam entender o que aconteceu, que palavras foram ditas por quem, por que diabos ainda dói tanto. Carrego essa ferida comigo. E eu, claro, não sou a única, diz o povo que estuda os psiquismos. Tomei um fora literário? Sim, é um jeito de contar. Mas quero me agarrar é em outra coisa: a alegria de receber, da pessoa sobre quem eu escrevi, notícias de um muro que está vindo abaixo. Eu escrevi essa história pensando em quais são as palavras que convocam para a ação e eis que, a 244 quilômetros daqui, um homem com uma picareta está derrubando um muro. Although we must decline, mas não tem um motivo claro, e me parece que, no fundo de tudo, não há palavras que façam uma recusa doer menos. O que eu sei é que palavras, as minhas, sobre elas tenho controle, e com elas eu posso deslocar as coisas concretas feito o muro. O que mais eu posso querer?